Olá e bem-vindo ao terceiro artigo da série sobre resíduos!
É verdade que as incineradoras resolvem o problema do volume ocupado pelo lixo, permitem destruir em segurança resíduos hospitalares e também produzem energia elétrica. É curioso que agora, já nem lhe chamam incineração mas sim, “valorização energética”.
Mas será que são só vantagens?
Vamos descobrir!
Em Portugal temos duas incineradoras em funcionamento, uma em Lisboa e outra no Porto.
Apesar das vantagens da incineração, já referidas anteriormente, ao incinerarmos os resíduos a altas temperaturas são produzidos resíduos altamente perigosos e tóxicos como as dioxinas, os furanos e os PCBs.
Índice
Não temos como fugir às dioxinas
Essas moléculas, mais especificamente as dioxinas (que são as piores), acumulam-se na gordura do nosso corpo e causam várias doenças, incluindo o cancro, infertilidade e mutações genéticas.
O que torna o caso das dioxinas ainda mais preocupante é o facto de não haver forma de as retirarmos do nosso organismo.
Os cálculos dizem que, se fosse possível parar a contaminação com dioxinas repentinamente, ainda demoraria 6 gerações a deixar de estar presente no corpo dos nossos descendentes!
Os homens não têm forma de as retirar do corpo ou de diminuir a sua quantidade. Mas as mulheres sim, têm forma de as reduzir, tendo um bebé.
As dioxinas vão-se acumulando no corpo das mulheres até estas engravidarem e depois passam para o feto, tendo um efeito muito maior no bebé e afetando o desenvolvimento do seu cérebro, do seu sistema imunitário, o desenvolvimento dos órgãos sexuais, entre outros efeitos muito perigosos e prejudiciais.
Como as dioxinas interferem com o bom desenvolvimento do bebé, os efeitos são muito mais graves do que num adulto. O desenvolvimento de um bebé é um caminho de apenas um sentido. Caso aconteça algum problema grave durante a gestação, não há forma de voltar atrás.
Estas substâncias interferem com o nosso ADN e todos nós as temos presentes no nosso corpo porque estão presentes na água, no ar e nos alimentos.
Dioxinas e a guerra do Vietname – Um caso de estudo
Para que percebas melhor os efeitos que as dioxinas têm na saúde vou falar-te da guerra do Vietname.
Na guerra do Vietname o exército norte-americano pulverizou dioxinas, das mais tóxicas, juntamente com um herbicida para contaminar as plantações e cortar o fornecimento de alimentos ao exército vietnamita.
Hoje, 42 anos depois, a manifestação dos efeitos das dioxinas é evidente e trágica.
Existem milhares de bebés e de crianças com deformações congénitas muito graves, uma sequela muito dura com a qual a população vietnamita luta diariamente. Até existe um hospital inteiro dedicado a tomar conta dessas crianças, muitas delas abandonadas pelos pais à nascença…
Biomagnificação
É importante entendermos que na natureza tudo o que se dispersa volta a concentrar-se.
Como o ser humano espalha dioxinas pelo ar, pela água e pelos solos, estas vão voltar a concentrar-se nas plantas e nos animais que vivem em terra e no mar. Assim, entram no nosso corpo de forma concentrada através da água e dos alimentos.
Chama-se a esse processo biomagnificação, porque esses poluentes têm um efeito cumulativo à medida que percorrem a nossa cadeia alimentar, até chegarem a nós.
As produções agrícolas e a produção animal que estão nas proximidades das incineradoras são as mais rapidamente afetadas.
Para teres uma ideia, uma vaca come junto com a erva em apenas 24 horas a quantidade de dioxinas que seria necessário tu respirares durante 14 anos!
Este exemplo demonstra de forma perfeita o efeito exponencial da biomagnificação.
A tua lareira produz cinzas?
A incineração também
Além de muitas incineradoras excederem o limite de emissões de dioxinas para o ar, ainda temos a questão das cinzas resultantes da queima do lixo.
Existem dois tipo de cinzas:
- As cinzas maiores como as de uma lareira, que são tóxicas (bottom ash)
- As cinzas na forma de pequenas partículas, capturadas pelos filtros anti-poluição atmosférica (quando existem e quando funcionam corretamente), que são ainda mais tóxicas (fly ash).
As cinzas de maiores dimensões representam cerca de 90% da queima e as mais pequenas 10%.
As cinzas mais grossas têm cerca de 30 vezes mais dioxinas do que a quantidade de dioxinas que são libertadas para o ar diretamente.
As cinzas mais finas têm cerca de 100 vezes mais dioxinas do que a quantidade de dioxinas que são libertadas para o ar diretamente.
Estas cinzas são supostamente usadas para produzir tijolos de betão para a construção de edifícios e de habitações e também para fazer asfalto, numa tentativa de reaproveitar estes resíduos.
No entanto a ciência NÃO aponta que o uso destes materiais feitos com as cinzas ricas em dioxinas, PCBs, furanos e outros compostos químicos perigosos na construção seja seguro para a saúde.
As estatísticas apontam que 50 a 80% da contaminação mundial de dioxinas seja proveniente das incineradoras.
A solução não está em os engenheiros arranjarem formas “milagrosas” para fazer desaparecer todo o lixo que se está a produzir.
A solução é simplesmente produzir menos lixo.
Os bons hábitos de consumo de há 50 anos atrás perderam-se em nome de uma falsa conveniência que a indústria dos plásticos e dos recipientes descartáveis nos venderam.
Não precisamos de reinventar a roda e o nosso dia-a-dia também não vai deixar de ser prático. Basta ir buscar ao passado os bons exemplos e pô-los em prática hoje.
Um forte abraço e até ao próximo artigo,
Miguel Murteira